
(A imagem apresenta na parte inferior, pequenos arbustos, vegetação tipica do cerrado, e no alto, o morro do Falcão, que fica atraz do setor Jofre Parada, em Luziânia Go. O morro apresenta um corte horizontal, uma espécie de cicatriz, marcas do trabalho escravo, que originou o rego saia velha com mais de 48 Km de extensão.Foto tirada das mediações do Clube AABB,na região que se abre para um grande vale, onde o acesso se da atraves de uma pequena trilha. Foto: Alexandre Moska 2010)
(Transcrito por: José Álfio e Rosana Roriz de Lima Reis.)
No dia 11 de abril de 1768, fundou-se no arraial uma sociedade entre o capitão João Pereira Guimarães, Manoel Pereira Guimarães, Manoel Ribeiro da Silva e Ventura Álvares Pedrosa, homens ricos e possuidores de grande escravatura; para canalizar a água do ribeirão Saia Velha e explorar as minas do Cruzeiro, próximas à povoação.
Tendo o major José Pereira Lisboa declarado em palestra que a água do Saia Velha poderia vir às minas do Cruzeiro não em rego ou canal, mas em cabaças e que duvidava do cometimento do capitão João Pereira Guimarães e seus sócios, os intrigantes trataram logo de levar esta conversa ao conhecimento de Guimarães e este, recebendo o pião na unha, tomou nota e esperou.
A sociedade atacou com força e tenacidade os serviços do gigantesco rego, os quais sendo começados em abril de 1768 continuaram por todo ano de 1769 e, a onze de setembro de 1760, quando menos se esperava, foi aberto o dique que tinha sido feito nas Terras Altas, e água jorrou barulhenta, pela rua do rosário abaixo, conduzindo um turbilhão de cabaças, que produziram um ruído original, acompanhado por uma canção esquisita e insultuosa, cantada por mais de 100 escravos que, com cacetes quebravam as cabaças. Chegando o Major José Pereira Lisboa a janela de seu sobrado, sito a rua do rosário, viu aquele espetáculo tão fora do comum e ouviu que a canção lhe dizia respeito e era muitíssimo ofensiva a seus brios. Sem perda de tempo, saltou a rua e, com uma arma de fogo, procurava repelir a ofensa que lhe era feita. Nesse momento apareceu o Juiz ordinário José Rodrigues costa que, em vez de acalmar os ânimos, tomou o partido do genro e parentes de Guimarães que eram os autores do insulto, pois o próprio Guimarães dele não fez parte, porque estava doente, de cama, em sua residência, no Engenho da Palma. Em seguida, chegou da chácara de Lisboa, que ficava de vista, um grande contingente de escravos, feitores e amigos, chefiados por seu filho Lourenço Lisboa e o conflito assumiu proporções assustadoras. Indignado com a parcialidade do Juiz, Lisboa atirou ao lado a arma de fogo e, sacando do espadim, arrancou-lhe o chinó, deixando-lhe a calva à mostra. Intimado pelo Juiz para se entregar a prisão, Lisboa a ela não se opôs, porém o povo, vociferando de ódio, procurou impedi-la, dando viva a Lisboa e morras ao Juiz. A muito custo, Lisboa, que era homem ilustrado, pacato e respeitador das leis, convenceu os seus amigos que para mais facilmente provar a sua inocência convinha não haver reação; desceu, então, para a casa que servia de prisão, acompanhado por mais de 1000 pessoas. Nada mais burlesco e nada mais engraçado do que aquele juiz sem peruca e sem chapéu, todo molhado e cheio de lama, a frente dessa onda revolucionária, que tão positivamente estigmatizava o seu baixo procedimento e que de um momento para o outro podia linchá-lo. O capitão João Pereira Guimarães, apesar de doente apareceu a noite no arraial e solicitou a soltura de Lisboa, perante quem se justificou; porem o juiz a nada quis atender chegando mesmo a indispor-se com o Capitão Guimarães. A 15 de outubro de 1771, seguiu escoltado com as devidas honras, para Vila Boa, o major José pereira Lisboa. Nesse dia, antes de amanhecer, a praça unida à prisão em que estava o ilustre criminoso, regurgitava de povo para obstar a sua partida; mas Lisboa nisso não consentiu. A 03 de dezembro de 1773, voltou Lisboa de Goiás, sendo recebido com as mais ruidosas manifestações de alegrias por parte do povo, indo ao seu encontro mais de duas mil pessoas. Apeou-se na Matriz, onde o esperavam o vigário, e todo o clero e as irmandades de onde assistiu ao te deum, em ação de graça pelo seu livramento. – é esta pequena história do célebre rego de Saia Velha, que ainda hoje é admirado e que tem sido ultimamente objeto de estudos, para o futuro abastecimento de água desta cidade. O incidente havido com o major Lisboa tirou aos empresário dessa importante obra o prazer de gozá-la e conservá-la, tanto que a água correu nas minas do cruzeiro “hoje Cazil” por muito pouco tempo, sendo a conservação do rego logo abandonado. Esse serviço ali esta feito com seu enormes aterros e seus cortes admiráveis; falta agora que os habitantes de Santa Luzia se congreguem e façam no rego os necessários reparos, para que tenhamos um farto abastecimento da excelente água do Saia Velha. – Quere é poder: A realização desse importante melhoramento não é tão custosa como a principio pode parecer; e com isto a nossa terra lucraria a imensamente. A água, com um percurso de cerca de 04 légua nos chegaria suficientemente oxigenada e, além disso, poderia melhorar muitíssimo os campos por onde tem de passar; pois, é sabido que todo o límpido ribeirão pode ser canalizado para esta cidade, pelo extenso e afamado rego. (Do Memorial Gelmires Reis, Casa da Cultura de Luziânia. Livro: Almanach de Santa Luzia; Organizado por: Evangelino Meireles e Gelmires Reis, 1920, Tipografia de O Plnalto. Santa Luzia – Go. Pág. 16 a 20).